terça-feira, 23 de outubro de 2012

Ao saudoso João Vicente... um homem de Deus!

Há tempos vinha ensaiando escrever algo em homenagem à memória do saudoso João Vicente André, meu amigo. 
A relutante idéia de por no "papel" algo que desejava escrever pode ser a matiz do medo interno de ter que tocar num assunto que não me traz boas lembranças... A morte física do meu amigo e pastor...
Mas, enfim, chega aquele momento em que a gente dá uma paradinha, encara os fatos e inicia o exercício de expressar a palavra entalada na garganta e o sentimento guardado no peito, "a sete chaves"... 
João Vicente, um grande homem de Deus, partiu do nosso meio no dia 04 de junho de 2011, jovem, com 46 anos de idade, vitimado por uma diverticulite, na sala de cirurgia.
Para nós a sua partida foi uma perda muito dolorosa e difícil. Ele não era apenas o meu pastor e da minha família. Tornamo-nos amigos pessoais.
Lembro-me de quando ele e sua amada Silvana estavam saindo de Porto Velho rumo ao Sul do país. Era 17 de março de 2011, dois dias depois do meu aniversário, data esta que o fez permanecer na capital de Rondônia, para prestigiar-me... O JVA era assim... importava-se mesmo com as amizades que tinha e sabia como prestigiar, valorizar e cultivar boas amizades. Aprendi muito disso com ele.
Recordo-me bem que na manhã daquele dia, a caminho do trabalho, por volta das 7h e 30min., passamos na casa deles para uma breve despedida, mas o casal não estava lá. Tinha ido tomar café da manhã de despedida com a "turma de Humaitá", como ele mesmo gostava de dizer! Uma família muito querida lá do "Guapa", cuja matriarca é a dona Maria. Então, deixamos recado com a Solange e fomos trabalhar.
Depois de bater meu ponto, retornei, agora, sem a minha esposa, que não quis me acompanhar porque não queria chorar na despedida do JVA e da sua amada Silvana. Seria a última vez que veria a face do pastor... Senti um aperto incomum no meu coração. Oramos. Daí, tiramos a foto que está nesta postagem, nos despedimos e só então partiram para uma viagem programada para durar um ano e meio de pós doutoramento pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, no vale dos vinhos, em Bento Gonçalves e região.
Contudo, como ele mesmo deixou escrito na página 48 do seu livro "Ser ou não ser pastor... Eis a questão! reproduzo: "De fato, Deus sempre é bom, mesmo quando sofremos, quando perdemos alguém querido, quandoa não entendemos. É como a Bíblia afirma: "Todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus e que foram chamados segundo o Seu propósito" (Romanos 8.28).
Nesse ponto quero fazer uma digressão, repetir algo que já escrevi, em outro contexto.
Chegamos no "Guapa", em meados de 2006. Fomos muito bem recebidos. Uma igreja amorosa e de coração dilatado.
Até então, éramos membros de uma outra denominação, no entanto, tornou-se penoso para nós, o tráfego de moto até lá. Além da distância, estávamos contrariando a lei do bom-senso e a lei de trânsito e suas regras. Tínhamos uma pequena motoneta, de 125 cilindradas, a C100 Biz. Era montados naquele cavalo de duas rodas que andávamos pra lá e pra cá...
Ao romper a frequência aos cultos na Batista Nacional, que ficava do outro lada da cidade, recusava-me a ir em "uma igreja qualquer". Temia e não queria participar de cultos chatos e cheios de "mizuras", como diziam lá pelo Guapa, a igreja mais "fanta" de Porto Velho! conforme fazia questão de falar o JVA.
Na primeira vez em que sentei-me num daqueles bancos (ainda de madeira), desconfiado, fiquei observando o jeito daquele homem barrigudo, intrigante e instigador. Com densidade e autoridade, saiam as palavras que proferia.
Mais tarde ficamos sabendo que a simplicidade e simpatia do João Vicente, graças à intimidade daquele homem com o Senhor, destacava-se em meio às muitas titulações pessoais (doutorados, mestrados e outros "ados"). Coisa rara, como ele mesmo costumava dizer em relação a alguns profissionais por aí...
E foi assim, que já naquela primeira vez, cativaram-me suas provocações. Não tive receio. Deveria permanecer por ali mesmo. 
Quebrou-me o pedigree "central" em relação ao que aconteceria se frequentássemos uma "igrejinha de periferia"...
Com o desenrolar dos dias ficava mais evidente que havíamos descoberto uma pérola, mais uma das boas dádivas que Deus estava acrescentando em nossas vidas, sem dúvidas!
Para nós (eu, esposa e filhas), a família André, na pessoa do amigo, irmão e pastor João Vicente André, sua esposa Silvana e seus filhos, Natália, Mateus, Lucas e a sua esposa Samara, foi um acréscimo inconteste da bênção de Deus em nossas vidas.
O tempo foi passando e com os laços se fortalecendo, fomos descobrindo que o jeito sincero, franco, contestador, desafiador e incisivo do pastor causava inquietações descabidas em muita gente.
Apesar do jeitão que tinha (lembrava a "truculência" de um trator em obras!), sabíamos da necessária chicotada que a nossa carne, sem-vergonha, precisava. Coisa que o nosso ego não fica atrás, pela nossa "justiça própria"...
Não havia outro jeito, a não ser aguentar as justas "chineladas".
Passamos do convívio preliminar ao contato menos formal e, cada vez mais, de amizade sincera. Criamos vínculos fortes e passamos a entender e a respeitar, mais ainda, a identidade do "pastor-homem". Ele não tinha medo de dizer o que sentia ou o que pensava. Ele se portava e se identificava como qualquer um de nós. Despojado do ar "santarrônico", construído sob o velho estereótipo: - Ei! "vocês" são as ovelhas, "Eu" sou o "todo-poderoso" pastor! "Vejam que as coisas que vocês sentem na pele não me atingem"...
O fato de conhecê-lo em suas limitações humanas não nos deixou faltar o respeito, o amor, o carinho e a honra para com o João Vicente, pastor-homem.
Ao contrário, essa forma íntima e cooperativa nos ajudou e nos ensinou a libertar-nos de muitos conceitos errados e que apenas significavam ranço de uma falsa e hipócrita religiosidade, aquela que nos aprisiona e nos lança no fosso de uma santidade comercialista, que nos impõe regras do "não fale isso, não use aquilo, do grite e do chore!", ou, "faça isso, use aquilo"...
Sob a mentoria do João Vicente André, o pastor que não fazia questão de usar terno e nem gravata, pudemos entender, compreender e apreender que o cristão não precisa ser sisudo para ser considerado "cheio da unção" e que a graça de Deus também se manifesta no ato de confrontar cristãos para vê-los amadurecer na fé, transportando-nos da estatura de infantilidade (cristãos carnais) para compromissos mais amadurecidos; avançamos para a compreensão de que a salvação é um compromisso sério de Deus para conosco e que, por isso, ter o nome escrito na Lista Celestial é irrevogável e que o fantasma do apagar o nome do Livro da Vida é uma tarefa impossível para a "borracha do céu".
Aprendemos muito mesmo.
Ao amigo, irmão e pastor João Vicente, tivemos a oportunidade, graças a Deus, de dizer a ele, a respeito da nossa gratidão pela paciência, zelo, conselhos, dedicação, carinho, amizade e amor com que ele e sua linda e abençoada família nos acolheram e nos trataram durante todo aquele rico período que estivemos juntos naquela etapa da caminhada de irmãos em Cristo, ali, na pequena igreja do Guapa.
Bem sei que a partida dele, no tempo determinado pelo Pai, apesar de ainda não entender muito bem, deixou a clara certeza da graça, zelo, misericórdia, bondade e amor de Deus para com aquele pequeno rebanho que foi pastoreado no "Guapa", durante os anos em que aquele "doutor de sandálias" permaneceu lá. Uma igreja local, estabelecida pelo próprio Senhor Jesus, ao qual apresento a nossa gratidão pois Ele é o noivo e dono da Igreja em toda a Terra, Autor e Consumador de todas as coisas.
Ao Senhor Deus, toda a honra, glória, domínio e poder, que conforme a Sua santa vontade, guarda-nos sob as suas asas e nos defende pela força do Seu poder; nele estão as realizações dos nossos sonhos, projetos, metas e objetivos, os quais são aperfeiçoados e realizados conforme a Sua vontade, que é boa, agradável e perfeita (Romanos 12.2).
 
Porto Velho, 23 de outubro de 2012.
 
 
Wagner Cunha Pedraza

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